John Markoff
Um dos nomes mais tradicionais da computação está aderindo à corrida pelo desenvolvimento de tecnologia que permita sequenciamento de genomas individuais ao custo de US$ 1 mil. A IBM planejava oferecer na terça-feira detalhes técnicos sobre o seu projeto para esse fim, e também para atingir um objetivo de longo prazo, que envolveria reduzir o custo a apenas US$ 100, o que tornaria o mapeamento de um genoma pessoal mais barato do que um ingresso para uma grande produção da Broadway.
O projeto coloca a IBM em uma corrida internacional pela redução no custo do sequenciamento de genes, o que permitiria o avanço na direção da era da medicina personalizada. A esperança é que a medicina genômica personalizada venha a propiciar significativos avanços em termos de diagnóstico e tratamento.
A IBM já tem em funcionamento uma ampla gama de projetos tanto científicos quanto comerciais, em campos como o desenvolvimento de supercomputadores projetados especificamente para a modelagem de processos biológicos. Os pesquisadores e os executivos da empresa esperam que seja possível utilizar seus conhecimentos especializados na fabricação de semicondutores, projeto de computadores e pesquisa de ciência de materiais a fim de desenvolver uma máquina integrada de sequenciamento genético, que ofereceria avanços tanto em termos de precisão quanto de velocidade, e reduziria consideravelmente o custo do processo.
"A biologia está se tornando mais e mais uma disciplina anexa das ciências da informação, e é esse exatamente o negócio da IBM", disse Ajay Royyuru, o diretor geral do centro de biologia computacional da companhia, parte do Thomas J. Watson Laboratory, localizado em Yorktown Heights, no Estado de Nova York.
O sequenciamento de ADN começou como uma tarefa para centros acadêmicos de pesquisa, nos anos 70, e o Projeto do Genoma Humano, o grande esforço original de pesquisa nesse campo, conseguiu sequenciar o primeiro genoma completo em 2001, a um custo estimado em cerca de US$ 1 bilhão.
De lá para cá, o campo de pesquisa da genômica está se acelerando consideravelmente. Nos últimos quatro ou cinco anos, o custo do sequenciamento vem, a cada ano, caindo em cerca de 10% com relação ao valor do ano precedente, de acordo com George Church, especialista em genética da Universidade Harvard.
Church diz acreditar que o setor seja capaz de manter essa tendência de redução, mesmo que em ritmo mais baixo, pelo futuro previsível.
Ao menos 17 empresas, algumas das quais iniciantes mas outras já bem estabelecidas, estão envolvidas na corrida pela redução dos custos de sequenciamento, com o desenvolvimento de tecnologias de terceira geração.
Hoje, o sequenciamento do genoma humano é um processo com custo de US$ 5 mil a US$ 50 mil, ainda Church tenha enfatizado que nenhum dos esforços realizados até agora tenha conseguido obter pleno sucesso, e que nenhum dos grupos de pesquisa envolvidos na disputa tenha até agora sequenciado todo o genoma de um indivíduos.
A abordagem da IBM se baseia naquilo que a empresa descreve como um "transistor de ADN", que ela espera seja capaz de ler os nucleotídeos individuais em um feixe isolado de ADN que seja distendido por um orifício de proporções atômicas conhecido como "nanoporo".
Um sistema completo consistiria de dois reservatórios de fluido separados por uma membrana de silício equipada com um conjunto de até um milhão de nanoporos, o que permitiria sequenciar imensos volumes de ADN simultaneamente.
A empresa informou que o objetivo de sua pesquisa era o de construir uma máquina que teria a capacidade de sequenciar um genoma individual com até três bilhões de bases, ou nucleotídeos, "em um prazo de algumas horas". Um sistema dotado dessa potência e com essa velocidade operacional é considerado um desdobramento essencial para que seja possível realizar os avanços que conduziriam à medicina personalizada, disseram os pesquisadores da IBM.
O cerne do sistema desenvolvido pela IBM é um mecanismo inovador, de certa forma semelhante a um conjunto de pinças funcionando em escala nanométrica. O mecanismo propicia sucessivas interrupções no momento de um feixe de ADN, que por natureza tem carga elétrica negativa, ao longo de um campo elétrico que o propele por um nanoporo, um orifício de apenas três nanômetros de diâmetro.
Um nanômetro, ou seja, o equivalente a um bilionésimo de metro, é uma medida 80 mil vezes inferior à da espessura de um fio de cabelo humano.
Os pesquisadores da IBM afirmam que conseguiram utilizar com sucesso um microscópio de transmissão eletrônica para perfurar um orifício em um aparelho semicondutor, com o objetivo de "puxar" o feixe de ADN pela abertura e depois interromper seu movimento por um prazo de talvez um milissegundo, com o objetivo de determinar o ordenamento das quatro bases do nucleotídeo - adenina, guanina, citosina e timina - que formam uma molécula de ADN.
A equipe da IBM, que iniciou o projeto em 2007, anunciou que já é capaz de movimentar confiavelmente os feixes de ADN pelos nanoporos, mas que a tecnologia de sensores necessária a controlar o ritmo de movimento e para ler bases específicas ainda não havia sido demonstrada.
A despeito do otimismo dos pesquisadores da IBM, uma cientista independente apontou que diversas abordagens de sequenciamento com o uso de nanoporos já vêm sendo tentadas há anos, e que o sucesso dessa técnica até o momento foi bastante limitado.
"Os feixes de ADN parecem se comportar de maneira muito voluntariosa", disse Elaine Mardis, co-diretora do centro de genômica da Universidade Washington, em St. Louis, apontando que o ADN muitas vezes assume número diferente de formações, em lugar de se comportar como um eixo ordenado, ao passar pelo nanoporo.
Mardis também informou que os esforços anteriores para criar sensores uniformes de nanoporos produzidos com base no silício haviam obtido resultados decepcionantes.
Uma das vantagens cruciais necessárias para melhorar a qualidade da análise de ADN é a capacidade de ler sequências mais longas. A atual tecnologia em geral permite a leitura de entre 30 e 800 nucleotídeos, enquanto o objetivo é desenvolver a capacidade de ler sequências com até um milhão de bases de comprimento, de acordo com Church, que falou em julho em um fórum patrocinado pela Edge.org, uma organização sem fins lucrativos que mantém um site de discussões sobre ciência.
Outras abordagens para obter sequenciamento mais rápido e mais barato incluem uma abordagem biológica para os nanoporos, em desenvolvimento pela Oxford Nanopore Technologies, uma empresa iniciante sediada na Inglaterra, e um sistema baseado em um microscópio de elétrons, que está em desenvolvimento pela Halcyon Molecular, uma discreta empresa iniciante do Vale do Silício que desenvolveu uma técnica para distender feixes isolados de ADN sobre uma fina película de carbono.
A empresa talvez consiga obter imagens de feixes com até um milhão de pares-base de extensão, de acordo com Church, que serve como consultor para a Halcyon e diversas outras companhias. "Para que possamos introduzir a era da medicina personalizada, não basta conhecer o ADN de uma pessoa média", diz Gustavo Stolovitzky, biofísico da IBM que é um dos pesquisadores responsáveis pelo projeto da empresa.
"Como comunidade, se tornou claro que precisamos realizar esforços para conduzir sequenciamento de uma maneira rápida e barata".
The New York Times