O aumento dos crimes cometidos pela internet, além da dificuldade de criação de novas leis e interpretações judiciais por meio das provas digitais, foi um dos temas centrais de um debate ocorrido esta semana em São Paulo e que reuniu especialistas do setor de segurança pública e direito virtual. Um dos representantes da Polícia Federal revelou que o órgão está se reestruturando para combater os crimes cibernéticos.
Com o título "Os Crimes Cibernéticos no Brasil", o debate concluiu que o Brasil ainda tem um longo caminho a percorrer até se equiparar a outros países que possuem legislações específicas, e com penas severas, para os crimes cometidos pela internet.
O delegado da Polícia Federal, Rodrigo Bittencourt, afirmou que o órgão está se reestruturando e, principalmente, está em fase de capacitação de seus representantes para combater o crime na internet. "Hoje, estamos no momento de descentralizar nossos serviços, capacitando os servidores em todos os estados", disse.
Bittencourt também revelou que a proposta é que a Polícia Federal tenha uma coordenadoria de controle ao crime virtual, oferecendo apoio a todas as instituições de segurança.
Segundo ele, as fraudes bancárias são líderes no quesito da criminalidade virtual, causando prejuízos anuais de até R$ 500 milhões aos bancos.
Um dos planejamentos de combate ao roubo virtual aos bancos foi a criação do Projeto Tentáculo, que tem um banco de dados centralizado e com informações de todas as fraudes bancárias existentes. "Com ele teremos uma visão mais ampla das ameaças", avalia.
Para o advogado Renato Opce Blum, especialista em direito eletrônico, o judiciário está se adequando às novas tecnologias. "Tanto que hoje um documento eletrônico é usado como prova durante um processo judicial", diz. Porém, ele alerta para a falta de conhecimento do usuário, cuja falta de cautela possibilita a invasão do sistema. "Nesse caso, o dono do provedor de acesso pode até ser responsabilizado, não como participante do crime, mas por negligência ao deixar a invasão. A lei é interpretativa", completa.
Blum acredita que futuramente haverá uma aproximação entre a área técnica e judiciária, assim como a criação de Varas especializadas. "O grande problema hoje são as universidades. Deveria ser obrigatório a inclusão da matéria sobre cibercrimes no curso de direito e não ser como optativa. Faltam profissionais".
Outro entrave apontado pelos participantes é a necessidade de adaptação e simplificação urgente do projeto de lei do senador Eduardo Azeredo, de 1999. O delegado Bittencourt afirma que a proposta é ampla demais e que muitos dos crimes não são cibernéticos. "No meu ponto de vista, apenas dois conceitos devem ser avaliados como ameaças virtuais: a invasão de sistemas e a difusão de códigos maliciosos".
Isso porque, conforme afirma Blum, quem cria um vírus não é criminoso e só é considerado quando o comercializa. "Se uma pessoa entra no meu sistema e simplesmente vasculha para ver o que tenho, também não é considerado crime. Se torna delito quando essa mesma pessoa invade e apaga um arquivo. Vale lembrar que no mundo virtual estamos acessíveis, principalmente agora com o uso do cloud computing".
Uma das propostas defendidas pelos dois participantes para a diminuição da criminalidade é que os provedores e empresas do setor intensifiquem a produção e a divulgação de aplicativos criptografados, e disponibilizem as chaves de segurança aos órgãos públicos. Esse método tornaria mais fácil identificar quem realiza infrações, como pedofilia e comercialização de "Boot" (uma espécie de vírus), além de ser uma maneira mais rápida de fiscalização. Porém, Blum ressalva que a polícia teria acesso às informações somente com uma ordem judicial.
Rodrigo Bittencourt aponta que o País é o maior exportador de hackers do mundo e que a falta de atenção dos governantes em acelerar a legislação adequada, em comunhão com as regras internacionais, o torna atrasado. "A Convenção de Budapeste tem a proposta de criar um mundo colaborativo para a segurança cibernética. Mas, com a nossa desorganização e a falta de preocupação sobre o caso, somos vistos como uma nação de segunda linha".
Com a aparência da falta de incentivo e reconhecimento para o caso, Renato Blum também aponta os usuários como grandes responsáveis pelos crimes cibernéticos. "O maior problema vem da desinformação do usuário comum, ele dá informação para todos e não se preocupa com o que esteja lidando. Ele deve tomar cuidado".
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